segunda-feira, dezembro 11, 2006

MAR

in Diario de Noticias por Tiago Pereira
Os músicos são os de sempre, assegurando o tal "ondular de música" que nos descrevem, aquele que acompanha a voz, personagem principal. Teresa Salgueiro, no centro do palco, concentrando atenções e sentidos. Mas, desta vez, por pouco tempo.
Movimentos estranhos entram em cena para se tornarem num só corpo, como complemento das canções. Os Madredeus recebem a "visita", em palco, do Lisboa Ballet Contemporâneo e das coreografias de Benvindo Fonseca. O espectáculo Mar chega hoje às lojas em formato DVD e procura recuperar um momento singular, revelando-o a quem o não presenciou.
Pedro Ayres Magalhães, dos Madredeus, explica-nos que "foi o Benvindo que nos convidou para colaborar com a jovem companhia dele. Ele tinha feito um programa, uma coreografia sobre a Ella Fitzgerald, e tinha a ideia de fazer uma trilogia onde incluiria uma cantora portuguesa, depois de um trabalho sobre Maria Callas. A autoria da obra é do Benvindo, foi ele que escolheu as canções e o alinhamento."
Tudo porque, confessa Benvindo Fonseca, "a música dos Madredeus é muito dançável e extremamente elevada. E o facto de eles poderem estar em palco, ao vivo, tudo isso ajudou para que a escolha fosse esta".
Percorrendo sobretudo o repertório do quinteto que forma os Madredeus desde 1996, 19 canções são apresentadas em palco em conjunto com dez bailarinos que procuraram, acima de tudo, exprimir, através do corpo, um sentido "mediterrânico e atlântico, da cultura latina, da família, da poesia, do culto do amor, dos sentimentos nobres". Diz-nos Pedro Ayres Magalhães. "E do mar, da água. Porque o mar é a palavra que mais divulgámos. Porque esta é uma música da margem sul do mediterrâneo, da costa ocidental da África, da América Latina, das terras da guitarra, do Sul da Europa, da terra da canção e do amor. E de rotas marítimas, de uma música ondulada, com o ritmo das vagas. Tem de ser efémera, não poder mais que uma sugestão, fugaz, como a água que nunca é a mesma".
Benvindo Fonseca embarcou na viagem e foi apreendendo "não só a música mas toda a emoção, toda esta mestiçagem, esta riqueza que se transforma facilmente em movimento".
"O público teve, pela primeira vez, a nossa música como fundo de outra coisa", diz Pedro Ayres Magalhães. "Porque o objectivo do grupo é criar música atmosféricas, música para a paisagem portuguesa. Não se insinua com o culto da personalidade dos intérpretes. E, ao existir uma linha de acção entre nós e o público, existiu também essa ideia de fundo, de ambiente."
Benvindo Fonseca refere apenas que "é uma música de fundo mas é uma coisa muito rica. São a poesia e as emoções que ressoam. Por isso é muito dançável, transformam-se as emoções em dança. E a voz da Teresa é muito rica. Tudo transporta muitas fotografias para criar. A poesia, por ser tão forte, pode ser um impulso como pode ficar subentendida".
Em palco vemos Teresa Salgueiro coreografada por Benvindo Fonseca. "A Teresa demonstrou-se sempre muito disponível", revela este. "Ela trabalha muito com o olhar e isso é fantástico. Tudo o que vinha dela era muito apelativo, o timbre da voz… Tudo isso foi luz para se criar, apesar de termos invadido um espaço que habitualmente é só dela." A banda está em interacção com os bailarinos - os músicos num plano mais recuado, divididos entre o tempo próprio da música e a cadência dos bailarinos em palco -, a voz e a poesia num encontro equilibrado entre música e movimento.
Mar é um projecto pensado como "um espectáculo itinerante, de uma companhia de música, poesia e bailado que se pode apresentar nos locais onde os Madredeus têm tocado", revela, a concluir, Pedro Ayres Magalhães.

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